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Kallos graphein bacterium

Kallos graphein bacterium
Caligrafia bacteriana
Academic project for the MA in Typographic and Editorial Contemporary Practices exploring alternative ways to represent the written word, by uniting form, concept and execution. In this case, I explored bacterial calligraphy and the subjectivity of the letter as symbol.
 
In Portuguese – English abstract below.
A palavra "Caligrafia" é formada por dois vocábulos gregos: KALLOS, que significa "belo", e GRAPHEIN, que significa "escrita". (1)
"Bactéria", do latim BACTERIUM, do grego antigo "bakterion": pequeno bastão. (2)
 
 
 
Resumo
 

A tipografia é muito mais que a simples representação de palavras. A sua forma e conceito podem ser exploradas de forma a aumentar a nossa interpretação do significado representado. Nós podemos ler uma palavra, mas podemos também interpretá-la visualmente. Esta pode comunicar mesmo antes de ser literalmente lida.
Kallos graphein bacterium é um projecto experimental que explora formas alternativas de representar a palavra escrita. Através do uso de bactérias como meio para desenhar as letras, pretendeu-se unir forma, conceito e execução. A intenção desta experiência é perceber se a caligrafia bacteriana é um processo viável para a criação de formas tipográficas, tendo em conta o equilíbrio entre um método apenas parcialmente controlável e os limites da legibilidade.
Neste artigo, descreve-se o processo realizado para criar as letras e apresenta-se os registos recolhidos ao longo de uma semana de incubação das bactérias. No final, utiliza-se a informação recolhida para criar letras, tanto estáticas como animadas.
 
 
Abstract
 
Typography is much more than the simple representation of words. Its form and conceptual basis can be explored in ways that augment our perception of meaning. We can read a word but we can also interpret it visually. It can communicate before it is literally read.
Kallos graphein bacterium is an experimental project that explores alternative ways of representing the written word. Through the use of bacteria as the medium to draw the letters, we intend to unite form, concept and execution. We want to understand if bacterial calligraphy is a viable method to create letterforms, considering the balance between a partially controllable method and the limits of legibility.
In this paper we describe the process used to create the letters and present the data collected in one week of incubation of the bacteria. This information is then used to create letterforms, both static and animated.
 
 
 
Palavras-chave
Caligrafia, Bactérias, Tipografia, Tipografia experimental, Caligrafia bacterial
 
 
Introdução
 
A work of design can be called “deconstruction” when it exposes and transforms the established rules of writing, interrupting the sacred “inside” of content with the profane “outside” of form. (3)
 
A tipografia – a representação visual da linguagem – tem uma vertente inevitavelmente prática, com um propósito muito concreto de comunicação e vinculação de uma mensagem. No entanto, a exploração formal e conceptual pode levar a resultados que questionam os limites da disciplina. Stefan Sagmeister é um excelente exemplo do uso de materiais e técnicas alternativas para criar composições tipográficas exploratórias (4). Entre os materiais que usou, destacam-se uma parede de bananas, tubos, até mesmo cortar o próprio corpo. Estes métodos pouco ortodoxos mostram-nos que é possível unir design emocional, divertido, exploratório, com excelentes conceitos.
 
Um dos objectivos deste projecto foi encontrar formas visualmente interessantes de desenhar a letra, unindo o conceito, à forma, e à própria matéria física. Para além de explorar técnicas alternativas de representação da palavra/letra, queria também experimentar um sistema que fosse parcialmente autónomo, e logo cujo resultado não estivesse totalmente sob o meu controlo. Em fases iniciais de pesquisa, passei pelo campo da Generative Art, mas acabei por focar o meu projecto na Bio Art (ou Microbial Art) – peças criadas usando organismos vivos, como bactérias ou fungos. A minha contribuição no desenho da letra seria o canal para as funções normais destes organismos – crescer e dividir-se.
 
 
Experimentação e Implementação
 
Tendo escolhido o método microbial como técnica para criar a tipografia, passei à fase de testes. No projecto "Bacterial Calligraphy: A Memento for Undergraduate Research Students" (5), estudantes escreveram as suas iniciais com bactérias Chromobacterium violaceum, que resultou em letras relativamente uniformes (ver imagem). No âmbito do meu projecto, tinha em mente criar formas fragmentadas que se desenvolvessem independentemente, de modo a obter um desenho final mais complexo, e cujo desenvolvimento ao longo do tempo fosse interessante de observar. Um dos objectivos basilares é a exploração da forma tipográfica, logo o meio usado na criação da letra é de extrema importância. 
 
Numa fase inicial, fiz um teste com colónias de bactérias extraídas de água da torneira de uma garrafa já usada, da minha pele, de terra, e de células DH5α™. Tirando partido dos recursos disponibilizados pelo Laboratório de Neurobiologia da Acção do Champalimaud Center for the Unkown, utilizei as amostras recolhidas para desenhar letras em placas de petri com gel TSA (triptona soya agar) (6), um meio de propósito geral utilizado para cultivo de uma grande variedade de microorganismos. Dos resultados conseguidos, as formas desenvolvidas a partir da água foram mais ao encontro do pretendido.
Como o objectivo seria criar caligrafia, uma forma muito pessoal de representar a palavra escrita, decidi unir a forma ao conteúdo através da utilização de bactérias recolhidas da minha flora bucal, misturadas com água. De forma a não marcar o gel, no desenho das letras usei pincéis de caligrafia desinfectados.
 
Inoculação das bactérias no meio de culturas, realizado no Laboratório de Neurobiologia da Acção do Champalimaud Center for the Unkown.
As placas foram depois incubadas à temperatura ambiente e o desenvolvimento das bactérias registado em intervalos de cerca de 6 horas nos 2 primeiros dias, e de 12 horas durante os 5 dias seguintes.
 
Os desenvolvimentos das culturas bacterianas foram imensamente interessantes de observar ao longo dos dias. Apesar dos testes iniciais, os resultados foram, em parte, inesperados. As culturas desenvolveram colónias de diversos tamanhos e cores (ao contrário dos testes iniciais mais uniformes), tornando as formas das letras menos simples de discernir, mas ao mesmo tempo mais ricas visualmente.
"a", "b", "type" e "ah!" após 1 semana de incubação.
Letra "b" – pormenor.
Letra "A" – pormenor.
Video time-lapse do crescimento das culturas bacterianas ao longo de 8 dias – letra "b".
Video time-lapse do crescimento das culturas bacterianas ao longo de 6 dias – palavra "type". Esta palavra tem melhor leitura passados 6 dias, em vez dos 8 dias das letras "a" e "b", possivelmente pela espessura do traço.
Letras finais
 
Na fase final do projecto, escolhi algumas das letras e palavras para desenvolver formalmente. Tratei a fotografia final da composição (versão fotográfica), vectorizei as formas recolhidas fotograficamente (versão vectorizada) e, nalguns casos, fiz ainda uma experiência em animação (versão video). Pretendi demostrar algumas das potencialidades formais da caligrafia bacteriana, e indiciar algumas das formas como poderiam ser posteriormente desenvolvidas e aplicadas em projectos gráficos – tipografia animada/video; desenvolvimento de uma fonte tipográfica; ilustração de um artigo; etc.
Letra "a"
versão fotográfica
versão vectorizada
versão video
Letra "b"
versão fotográfica
versão vectorizada
"eu" em duas variações caligráficas
 
União do conteúdo à forma, ao conceito de criação da própria letra: "eu" como tripla representação "do eu" – através da manualidade do desenho da letra, das minhas bactérias, responsáveis pela forma final, e do próprio significado da palavra escrita.
versão fotográfica
versão fotográfica
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Conclusão
 
Os resultados desta experiência demonstram que as letras e palavras criadas conseguem ter uma leitura razoável e formas variadas e potencialmente muito ricas, se bem que alguma sorte e experimentação são necessárias (por exemplo, a palavra "type" tem melhor leitura passados 6 dias, em vez dos 8 dias das letras "a" e "b", possivelmente pela espessura do traço). A caligrafia bacteriana pode ser explorada de inúmeras formas, com imenso potencial gráfico e conceptual. Aqui, o conteúdo pode habitar a forma, criando-a.
 
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Agradecimentos
 
Ao meu irmão Pedro Ferreira, por ser eternamente o Dexter para a minha Dee-Dee, e mais concretamente por me abrir as portas ao laboratório onde se encontra a realizar um Doutoramento em Neurociências. Também ao Champalimaud Center for the Unknown, por ser uma entidade científica tão aberta a parcerias artisticas, e a Maria Vito, pela ajuda e excelente preparação das placas tão essenciais neste projecto.
 
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Referências
 
(1) Cordeiro, Manuel de Oliveira (1963). Compêndio de Caligrafia. Lisboa: Livraria Popular de Francisco Franco
(2) Bacterium (n.d.). In Wiktionary. Retirado em Fevereiro de 2015 link
(3) Lupton, Ellen (2001). A Post-Mortem on Deconstruction?. In Heller, Steven & Meggs, Phillip B., Texts on Type — Critical Writings on Typography. New York: Allworth Press
(4) Popova, Maria (2013). Things I Have Learned in My Life So Far: Sagmeister’s Typographic Maxims on Life, Updated. link
(5) Ng, Wenfa (2012). Bacterial Calligraphy: A Memento for Undergraduate Research Students. link
(6) Liu, Shijun & Usinger, Laurie (2015). All About Agar. link
(7) Torres, María Eugenia (2013). Relación Huésped Parasito: Flora Humana Normal. link 
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